Quem vem lá?

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Das coisas que a gente fala e não tem nada a ver



Entrei no elevador, logo entraram outras pessoas, e, nessas situações, sei lá por quê, sinto uma constrangedora e irresistível vontade de rir. Na hora de sair, falei, vermelha e segurando riso:

-Obrigada!
E uma senhorinha, lá dentro:
- Magina, bem.

Fui embora pensando: “Ué, porque agradeci?? Por eles terem dividido o ar comigo?”. Nada a ver.

Numa outra ocasião, entrevistando um prefeito super sério pelo telefone, tratava-o por senhor o tempo todo. Conversa super formal. Na hora de desligar me distraí com um papo que rolava no msn, um amigo se despedia. Foi nesse momento que eu disse pro prefeito:

-Falou então querido, beijão.

Silêncio do outro lado.

-Pra senhora também.

Mão na testa. Noooossaaa, que que eu disse?? Nada a ver.

E quando a moça do pedágio deseja boa viagem? Eu quase sempre digo:

-Pra você também.

Por que boa viagem??... Eu na estrada e ela lá na cabine, viagem ali só se for de ácido, ela deve pensar ao despejar moedinhas na minha mão. Mas eu sempre corrijo, com sorriso amarelo:
- Quer dizer, bom trabalho. Hehehe.

E ela deve me achar muito, mas muito nada a ver.

De tarde, em casa, tocou a campainha e era um vendedor de rede. Abri a porta:
-Alô?
E ele, meio confuso:
-Alô, quer ver umas redes?
E eu, ainda sem me dar conta da cena nonsense que armara:
-Pode ser, quem é?
E ele, já arrependido de ter tocado minha campainha:
-É o vendedor.

Noossa, que que eu to falando? Muito nada a ver, comecei a rir e não conseguia parar. Acho que o homem das redes ficou com um pouco de dó.


São coisas que agente fala e só depois se dá conta, normalmente por distração, e que nesses casos, não trazem a necessidade de retratação. Falar sem pensar só é engraçado nesses casos, uma vez ouvi que é como atirar sem apontar.
Quando digo algo que diz respeito a mim, a sentimentos, meço muito bem, e respondo por tudo o que digo. Falar é atitude. E tem algo maior por trás, a intenção. Depois disso, a palavra, o beijo, o soco, o choro, são secundários. Não quer dizer que de vez em quando a porca não torça o rabo e eu me arrependa de alguma coisa que disse. Mas caminho e faço por onde para que minha mão só venha de encontro à minha testa por algum “obrigada” fora de hora, e não por algo que possa magoar ou ficar ecoando minha cabeça, até porque, nunca sei muito bem como voltar atrás, o que aliás, também não tem nada a ver.





segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Quando sobe o letreiro



A imagem é embaçada, como se houvesse um nevoeiro. Vou entrando por uma casa e gargalhadas são ouvidas de lá. Parada na porta o que vejo é dantesco: Uma sacanagem deslavada. E não há nada de erótico nisso. Uma suruba interminável, homens e mulheres formando uma grande macarronada humana. As pessoas usam máscaras, algumas com cabeças de bichos. São bisões, águias, cachorros e até galinhas. Penso em ir embora, mas sou sórdida e quero olhar mais um minutinho. Começo a gostar. Um pouquinho. A sensação é estranha: Algo meio nojento, mas que incita curiosidades e instintos mais recônditos. Como achar legal quando se aperta uma espinha e ela voa no espelho.
Cena seguinte: Estou numa arena. No centro, um homem em pé sob um tronco de árvore cortado. Uma multidão circunda esse homem baixinho e careca. Alguma coisa pega fogo por ali. O homem não tem o dom da oratória e eu vou dando as coordenadas afim de que ele subjugue a multidão. Falo coisas no ouvido dele, digo que ele tem que mostrar quem ele é, que ele devia dar uma lição naquelas pessoas. Ele se empolga, e eu trato de baixar a bola dele, digo que só comigo ele não pode, que a cara dele é se crescer pra cima de quem deixa e que por mim ele seria sempre dominado. Seria meu capacho, empregado, escravo, nada. Minha sordidez novamente se revela. Acordei atordoada. Em uma única noite fui voyeur de suruba e gerente geral do inferno.
Tenho visto muitas coisas, tantas realidades, tantas pessoas. A impressão que eu tenho é que vivi muitos meses só neste último. E não só isso, tenho vivido muitas horas dentro de uma, dias dentro de um. Isso tem me deixado à flor da pele (o que será que será), e tem uma razão de ser. É a minha vida de jornalista estimulando minha cabeça e me fazendo olhar de outra maneira pras coisas que me cercam. E isso é só positivo. Deixa de ser quando eu não consigo me desligar das muitas formas que vejo durante o meu dia e me afasto do que me mantém no lugar, no meu eixo. Quando eu vejo uma coisa que enche de cor o meu dia e outra que faria o diabo se arrepiar, e, antes de dormir, a segunda é que fica mais forte na minha cabeça. Tudo passa por mim quando o sono ousa se aproximar. Tento me concentrar, lembro de uma fita de relaxamento que eu tinha, tento rezar, tudo me dispersa.
Descobri que do alto dos meus quase 1.80m de altura, eu acordo com medo quando sonho que mando no capeta, e que, nessas horas, e em todas as outras, um abraço ameniza meus tormentos. Em meio ao turbilhão de informações a que venho sendo submetida, está muito bem guardado o que eu acredito, prova disso é que, observando a mega suruba do meu sonho eu pensei “que falta de romantismo”... Está guardado.